Estado
deplorável
O falso regime federativo
brasileiro foi esfacelado pela crise econômica criada pelo populismo petista.
Agora, governadores que fizeram despesas permanentes baseados na arrecadação
variável estão sem saída, a não ser peregrinar a Brasília em busca de recursos
SEM SALÁRIO - Protesto de servidores de Minas Gerais em Belo Horizonte: atraso no pagamento dos vencimentos
A recessão antecipou as dificuldades, mas o
desequilíbrio vinha sendo gestado havia algum tempo. "A crise fiscal dos
estados era esperada e inevitável, mesmo se o país não estivesse em
recessão", afirma José Roberto Afonso, pesquisador do Instituto Brasileiro
de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV). Entre outros problemas, a
guerra fiscal fez com que muitos estados abrissem mão de recursos importantes,
uma vez que ofereceram isenções com o objetivo de atrair empresas. A crise, é
claro, não pode ser desprezada. Em 2015, em todas as unidades da federação, as
receitas subiram abaixo da inflação do período - em cinco delas, houve queda na
arrecadação. Mas o que a recessão fez foi escancarar o quadro generalizado de
desequilíbrio. "Os estados pouco fizeram para aumentar a eficiência da
administração pública ou para cortar despesas quando o país crescia",
afirma o consultor Clóvis Panzarini. "Agora, com a crise, ficou mais
difícil tomar essas medidas." A situação não se tornou ainda mais
dramática porque alguns estados aprovaram leis para ter acesso a depósitos
judiciais. Foi o que fizeram o Rio de Janeiro, Minas Gerais e o Rio Grande do Sul:
eles contabilizaram 10,6 bilhões de reais de depósitos em juízo como receita
normal no ano passado. O dinheiro foi utilizado essencialmente para pagar as
despesas do dia a dia. A medida foi contestada pela Procuradoria-Geral da
República no Supremo Tribunal Federal, com a alegação de que se trata de
apropriação de patrimônio alheio, entre outras violações. Afinal, os governos
poderão ser obrigados a pagar essas disputas judiciais no futuro. Se isso
ocorrer, de onde sairá o dinheiro?
Enquanto perdiam recursos de um lado, os estados
multiplicavam despesas de outro. No Rio Grande do Sul, os gastos com benefícios
de aposentados e pensionistas é superior ao montante despendido com quem está
na ativa. No Rio de Janeiro, o governo prevê pagar 17,8 bilhões de reais com a
Previdência neste ano. As contribuições dos trabalhadores só devem render 4,9
bilhões de reais. Isso significa que o estado terá de bancar a diferença de
12,9 bilhões de reais retirando recursos de outras áreas, como saúde e
segurança pública. É um desequilíbrio crescente. Sem a adoção de medidas para
conter as despesas com a Previdência dos servidores estaduais, a conta ficará
cada vez mais no vermelho. Estados que se dispuseram a enfrentar a raiz do
problema e a buscar meios para conter o avanço das despesas, com a revisão de
contratos com fornecedores e o corte de cargos comissionados, ostentam números
mais equilibrados nas contas públicas. É o caso do Espírito Santo e de Santa
Catarina.
No geral, as perspectivas não são auspiciosas. Os
recursos que entram em caixa são utilizados quase que integralmente para pagar
as despesas do dia a dia. Os estados possuem baixíssima capacidade para
investir em obras de infraestrutura. Segundo cálculos de Pedro Jucá Maciel,
assessor econômico do Senado, em 2015 apenas o equivalente a 2% do orçamento
dos estados, na média, podia ser destinado a investimentos. O restante estava
todo comprometido com o custeio da máquina, aposentadorias e a dívida. Em 2014,
a folga era de 5%. Em 2016, a situação deve ser ainda pior. Mesmo estados que
dispõem de mais recursos são obrigados a reduzir o volume destinado a novos
projetos. É o caso do estado mais rico da federação, São Paulo. Os
investimentos foram reduzidos em um terço no ano passado até agosto, de acordo
com os dados recentes mais atualizados. Desde 2014, foram suspensas as obras de
expansão de quatro linhas de metrô. Assim, não existem dificuldades como as
vistas no Rio. Mas os atrasos comprometem obras que, além de melhorar a vida da
população, poderiam incentivar o crescimento econômico.
A presidente Dilma Rousseff contribuiu para a
situação financeira precária dos estados ao afrouxar, no primeiro mandato, os
limites de endividamento sem assegurar que os novos recursos fossem utilizados
de forma produtiva. "O espaço aberto no endividamento serviu para bancar a
contratação de mais servidores e conceder aumentos generosos", diz Afonso,
do Ibre. Na avaliação de Jucá Maciel, o eventual socorro da União só faz
sentido se for acompanhado de contrapartidas. "Se os estados não
restringirem despesas, a ajuda só empurrará o problema por mais algum
tempo."
Nenhum comentário:
Postar um comentário