domingo, 16 de abril de 2017

Richa e Gleisi podem ter o mandato cassado por caixa 2? Chance é quase zero

A abertura de 74 inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) e o envio de 201 petições para instâncias inferiores contra dezenas de políticos citados nas delações de executivos da Odebrecht dificilmente terão efeitos na esfera eleitoral. Traduzindo, é praticamente zero a chance de governantes perderem o mandato ainda que fique comprovado o recebimento de caixa 2 – seja pelo que prevê a própria legislação brasileira para esses casos ou pela demora que deve marcar o andamento judicial dos processos.
Prática que consiste em não contabilizar recursos financeiros usados em campanhas, o caixa 2 configura crime eleitoral e, em tese, pode resultar em penas que vão além da perda do mandato. Enquanto o artigo 350 do Código Eleitoral fala em prisão de até cinco anos, o artigo 22 da Lei Complementar 64, de 1990, determina oito anos de inelegibilidade.
No entanto, o artigo 14 da Constituição Federal e o artigo 30-A da Lei Eleitoral 9.504, de 1997, estipulam prazo de apenas 15 dias após a diplomação dos candidatos eleitos para contestações judiciais de mandatos sob suspeita de irregularidades financeiras durante as eleições. Na prática, todo candidato eleito pode, a partir do 16.º dia da diplomação, confessar a prática de caixa 2 sem correr grandes riscos de ser punido – e é exatamente o que muitos fazem (veja quadro).
Além desse, outros dois fatores jogam a favor daqueles com mandato que foram delatados por executivos da Odebrecht. O primeiro deles é o longo caminho que os processos levarão até que haja uma sentença judicial. Dos 47 mandatários investigados no STF pela “primeira lista de Janot”, enviada à Corte em março de 2015, por exemplo, somente 5 viraram réus. Até agora, ninguém foi condenado ou absolvido em definitivo. Essa lentidão deve se repetir em relação a quase uma centena de políticos com foro nos tribunais superiores que estão na “segunda lista de Janot”.
Como o crime de caixa 2 prescreve 12 anos o fato, em relação a Beto Richa (PSDB), por exemplo, bastante tempo já se passou das eleições para prefeito de Curitiba em 2008 (prescrição em 2020) e para governador do estado em 2010 (prescrição em 2022), nas quais é acusado por delatores de ter recebido dinheiro ilícito na campanha. Também pesa contra ele a acusação de ter contado com recursos da Odebrecht não declarados à Justiça Eleitoral no pleito de 2014 (prescrição em 2026).
O mesmo raciocínio se aplica à senadora Gleisi Hoffmann (PT). Ela teria recebido caixa 2 nas eleições de 2008 e 2014, quando foi derrotada por Richa, e de 2010, quando se elegeu para o atual mandato de oito anos no Senado.

Anistia

Também há um forte movimento no Congresso para anistiar o crime de caixa 2, tipificando-o expressamente numa nova legislação. Como o ordenamento jurídico brasileiro não permite que uma nova lei seja aplicada retroativamente, os políticos apanhados pela Operação Lava Jato se livrariam de eventuais punições. Eles defendem que é preciso “separar o joio do trigo”: diferenciar o que é recebimento de doações não contabilizadas à Justiça para cobrir gastos de campanha e o que é obtenção de recursos ilícitos em eleições para enriquecimento pessoal.
Como contragolpe, além da tentativa dos integrantes da Lava Jato de conquistar apoio popular para barrar a aprovação dessa medida, o próprio Supremo, no mês passado, tornou réu o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) sob a acusação de ter recebido R$ 500 mil de propina no esquema do petrolão por meio de doação oficial, devidamente contabilizada na prestação de contas, para sua campanha ao Senado em 2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário