Sem foro, esses senadores perderiam prerrogativa de serem julgados somente no Supremo e poderiam passar para a esfera do juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira instância.
Vinte e três
senadores alvos da Operação Lava Jato – ou de desdobramentos da investigação –
ficarão sem o chamado foro privilegiado se não se elegerem em 2018.
O número de
parlamentares nessas condições é quase metade dos 54 senadores cujos mandatos
terminam neste ano.
O foro por
prerrogativa de função, o chamado "foro privilegiado", é o direito
que têm, entre outras autoridades, presidente, ministros, senadores e deputados
federais de serem julgados somente pelo Supremo.
Sem isso, os
senadores passariam a responder judicialmente a instâncias inferiores. Como
alguns são alvos da Lava Jato, poderiam ser julgados pelo juiz Sérgio Moro,
responsável pela operação em Curitiba.
Nas eleições
gerais de outubro, dois terços (54) das 81 cadeiras do Senado serão disputadas
pelos candidatos. Os mandatos de senadores são de oito anos – para os demais
parlamentares, são quatro.
A cada eleição,
uma parcela do Senado é renovada. Em 2014, houve a renovação de um terço das
vagas (27). Cada unidade federativa elegeu um senador.
Neste ano, duas
das três cadeiras de cada estado e do Distrito Federal terão ocupantes novos ou
reeleitos.
Caciques ameaçados
Entre os
investigados que podem ficar sem mandato – e consequentemente sem foro
privilegiado – a partir de 2019, estão integrantes da cúpula do Senado.
São os casos do
presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE); do líder do
governo e presidente do PMDB, Romero Jucá (RR); do líder do
PT, Lindbergh Farias (RJ) e do líder da minoria; Humberto
Costa (PT-RJ). Os quatro são alvos da Lava Jato.
Ex-presidentes
da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), Garibaldi Alves
Filho (PMDB-RN), Jader Barbalho (PMDB-PA) e Edison
Lobão (PMDB-MA) também são investigados na Lava Jato e terão de
enfrentar as urnas neste ano.
Lobão é o atual
presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, um dos
colegiados mais importante da Casa.
Dois senadores
que presidem partidos são réus no Supremo Tribunal Federal (STF): Gleisi
Hoffmann (PT-PR), em ação penal da Lava Jato, e José Agripino
Maia (DEM-RN), em desdobramento da operação. Os dois também estão na
lista dos senadores com os mandatos a expirar.
O presidente do
PP, Ciro Nogueira (PI), é outro senador investigado na Lava
Jato que pode ficar sem mandato caso não se eleja em 2018. Na mesma situação
está Benedito de Lira (AL), líder do PP no Senado.
O atual
vice-presidente da Casa, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), é alvo
de inquérito em desdobramento da Lava Jato. Seu correligionário, Aécio
Neves (PSDB-MG) – ex-presidente tucano e segundo colocado nas eleições
presidenciais de 2014 – também é investigado no Supremo.
Alvo de
inquérito em operação derivada da Lava Jato, Aloysio Nunes (SP)
– hoje à frente do Ministério das Relações Exteriores – é outro tucano detentor
de mandato que pode ficar sem foro privilegiado se não se eleger em 2018. Ele
foi candidato a vice-presidente da República em 2014, na chapa encabeçada por
Aécio.
As líderes do
PSB, Lídice da Mata (BA), e do PC do B, Vanessa
Grazziotin(AM) – ambas investigadas em desdobramentos da Lava Jato – também
estão nessa lista. Vice-líder do PMDB, Valdir Raupp (RO) é réu
no Supremo após investigações da operação.
Outros
investigados que também são alvos da Lava Jato ou de investigações derivadas da
operação, os senadores Ricardo Ferraço (PSDB-ES); Dalirio
Beber (PSDB-SC); Eduardo Braga (PMDB-AM); Jorge
Viana (PT-AC); e Ivo Cassol (PP-RO) – já condenado
pelo STF em outra apuração sem ligação com a Lava Jato.
Sem receio de
perder o foro
Todos os
senadores citados nesta reportagem foram procurados pelo G1.
Os parlamentares que responderam aos
questionamentos dizem não ter receio de ficar sem a prerrogativa de foro
especial, que lhes dá o direito a responder aos inquéritos diretamente no STF,
instância máxima do Judiciário.
Eles lembram que votaram a favor de
uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que extingue o foro nos casos de
crimes comuns, como corrupção e lavagem de dinheiro.
O texto, aprovado pelo Senado no ano
passado, está parado na Câmara, sob análise de uma comissão que
sequer foi instalada.
A proposta prevê que somente os
presidentes da República, do Senado, da Câmara e do STF terão foro
privilegiado. As demais autoridades ficariam sem a prerrogativa e os processos
por crimes comuns seriam analisados pelas instâncias inferiores.
Celeridade
Recentemente,
dois políticos que ficaram sem o foro privilegiado foram presos pela Lava Jato:
o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que teve o
mandato cassado na Casa, e o ex-ministro do Turismo (nos
governos Dilma Rousseff e Michel Temer) Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que
também presidiu a Câmara.
Processos da Lava Jato costumam ser
mais céleres nas instâncias inferiores. Cunha, por exemplo, foi cassado pela
Câmara dos Deputados em setembro de 2016.
Sem foro, o peemedebista acabou
preso em outubro daquele ano após decisão do juiz federal Sérgio Moro, da 13ª
Vara Criminal de Curitiba (PR), responsável pelos processos da Lava Jato em
primeira instância.
Em março de 2017, Cunha foi
condenado a 15 anos de reclusão em um dos processos a que respondia no âmbito
da operação.
Já Henrique Eduardo Alves pediu demissão
do Ministério do Turismoem junho de 2016, ocasião em que deixou
de ter o foro privilegiado. Um ano depois, o ex-ministro de Temer foi preso em
um desdobramento da Operação Lava Jato.
Levantamento da Fundação Getúlio
Vargas, divulgado em fevereiro de 2017, mostrou que, de janeiro de 2011 a março
de 2016, somente 5,8% das decisões em inquéritos no STF foram desfavoráveis aos
investigados.
Além disso, o estudo apontou que o
índice de condenação de réus na Suprema Corte é menor do que 1%.
Uma das justificativas é o fato –
alegado pelos próprios ministros do STF – de que o Supremo está sobrecarregado,
com muitos casos para analisar.
Isso faz com que os processos
prescrevam e, consequentemente, os investigados fiquem sem punição.
SENADORES INVESTIGADOS NA LAVA JATO QUE PODEM PERDER O FORO EM 2019
Senador | O que disse | Pretende disputar as eleições? |
Aécio Neves (PSDB-MG) | Não respondeu. O senador tem afirmado que todas as doações recebidas foram legais e devidamente declaradas à Justiça. | Não respondeu |
Aloysio Nunes (PSDB-SP) | Não respondeu. O ministro tem negado irregularidades e afirmado que as doações recebidas não tiveram como contrapartida qualquer ato formal ou favor. | Não respondeu |
Benedito de Lira (PP-AL) | “Um inquérito já foi arquivado. O outro vai ser arquivado também, porque é uma repetição do primeiro. Pelo comportamento do Supremo, que não está julgando por mídia, mas pelo que tem no processo, e no processo a Procuradoria Geral da República não apresenta nenhuma vírgula contra ninguém. Há apenas insinuações de delatores. Não juntaram nenhuma prova, nada” | Sim, para reeleição ao Senado |
Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) | "Sou o único caso em que o próprio delator declara que me recusei a receber a doação pelo caixa 2. E a investigação, que é necessária e importante, comprovará isso" | Sim, para reeleição ao Senado |
Ciro Nogueira (PP-PI) | Não respondeu. A defesa de Ciro Nogueira tem negado que o senador tenha recebido qualquer valor irregular. Os advogados dizem que o parlamentar, por ser presidente do PP, reconhece que era responsável para pedir doações a empresas. | Não respondeu |
Dalirio Beber (PSDB-SC) | “Aguardo com absoluta tranquilidade o fim da investigação, pois estou certo de não ter cometido qualquer ato ilícito” | Não informou |
Edison Lobão (PMDB-MA) | “A defesa do senador nega que ele tenha cometido qualquer irregularidade” | Sim, para reeleição ao Senado |
Eduardo Braga (PMDB-AM) | "Primeiro quero esclarecer que não estou respondendo a qualquer inquérito na operação Lava Jato. Eu apenas tive meu nome citado por pessoas que não apresentaram qualquer prova contra mim. Também quero deixar claro que eu defendo a Lava Jato e espero, sinceramente, que as investigações transcorram de forma correta e dentro da lei" | Sim, para reeleição ao Senado |
Eunício Oliveira (PMDB-CE) | "Todos os esclarecimentos serão prestados à Justiça, quando solicitados" | Sim, mas não disse para qual função |
Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) | "Em sua narrativa, o próprio delator afirma que ele nunca ofereceu e nem pediu nada em troca. Inclusive, o delator esclarece também que se refere à eleição municipal de 2008, ocasião em que sequer fui candidato. No caso em que sou citado, a empresa fez uma doação eleitoral oficial para o PMDB, que repassou o recurso para a candidata à prefeita de uma outra agremiação política. Nada passou pela minha conta de pessoa física. Essa é a maior prova de que não fui beneficiário de nenhum valor" | Não respondeu |
Gleisi Hoffmann (PT-PR) | "Eu estou ciente que o STF vai, ao analisar com profundidade o que tem no processo com imparcialidade, com espírito aberto, conseguir ver que não tem sustentação, e a gente vai ter uma outra oportunidade, que eu não tive nas outras instâncias, vamos ter oportunidade de provar inocência" | Não respondeu |
Humberto Costa (PT-PE) | "Aguardo há três anos a conclusão do inquérito aberto, que só apresentou contradições do delator condenado ao longo das investigações e para o qual a Polícia Federal já pediu arquivamento por não encontrar quaisquer provas que o sustentem" | Sim, a princípio, para a reeleição no Senado |
Ivo Cassol (PP-RO) | “A Operação Lava Jato está passando a limpo a política brasileira. Todos nós, quando somos questionados por órgãos de fiscalização, temos o dever de prestar os devidos esclarecimentos. Assim como temos também o direito de nos defender, principalmente, do denuncismo e do achismo, de denúncias que são pinçadas de assuntos sem contexto. Não se pode colocar todos os políticos na vala comum. Todos meus atos são responsáveis” | Sim, para o governo de Rondônia |
Jader Barbalho (PMDB-PA) | Não respondeu. O senador tem negado as acusações contra ele. | Não respondeu |
Jorge Viana (PT-AC) | "Uma decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, atendendo a pedido do Ministério Público Federal, excluiu o senador Jorge Viana da lista da Lava Jato" | Sim, para reeleição ao Senado |
José Agripino Maia (DEM-RN) | “Como afirmado por todos os Ministros da 1ª Turma [do STF], o prosseguimento das investigações não significa julgamento condenatório. E é justamente a inabalável certeza da minha inocência que me obriga a pedir à Corte o máximo de urgência no julgamento final da causa” | Não respondeu |
Lídice da Mata (PSB-BA) | "Não tenho nada a dizer porque não sou alvo da Lava Jato" | Sim, para a reeleição ao Senado |
Lindbergh Farias (PT-RJ) | “Tenho absoluta certeza que os inquéritos terão como destino o arquivamento” | Não respondeu |
Renan Calheiros (PMDB-AL) | “São acusações infundadas, frutos de perseguição e generalizações feitas pelo antigo grupo do Ministério Público. Apresentaram denúncias sem provas, com base em declarações de delatores que sequer me conhecem. O STF arquivou seis denúncias. As outras também serão arquivadas porque não há provas. Não há sequer lógica nas narrativas” | Sim, para a reeleição no Senado |
Ricardo Ferraço (PSDB-ES) | “O ministro Fachin decidiu que o referido inquérito não faz parte do âmbito da Lava Jato, determinando sua redistribuição. Isso fortalece a convicção que sempre tive: de que as acusações são infundadas e não têm como prosperar” | Sim, para a reeleição ao Senado |
Romero Jucá (PMDB-RR) | “Sempre estive e sempre estarei à disposição da Justiça para prestar qualquer informação. Nas minhas campanhas eleitorais sempre atuei dentro da legislação e tive todas as minhas contas aprovadas” | Não respondeu |
Valdir Raupp (PMDB-RO) | Não respondeu. O senador afirmou que respeita a decisão dos ministros que o tornou réu na Lava Jato. Raupp, no entanto, diz que as doações que recebeu foram declaradas à Justiça e não podem ser consideradas como prova de "ilicitudes”. | Não respondeu |
Vanessa Grazziotin (PC do B-AM) | “Todas as doações de campanha que recebemos foram oficiais e declaradas à justiça eleitoral. Não temos receio das investigações, pois servirão para provar que não há nenhuma vinculação com a lava jato. Isso ficará claro ao término do inquérito” | Sim, para a reeleição ao Senado |
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