Nequinha e Roberto sugerem que a prefeitura crie uma cooperativa de catadores de recicláveis, para que as famílias mais carentes possam se sustentar
Só conhece bem a tortura
do desemprego, quem, um dia, se vê nessa situação. É nesse momento que a pessoa
se sente invisível, um ser que só é lembrado quando as contas começam a se
acumular e as cobranças chegam inevitavelmente.
Valter Aparecido Pereira da Silva, de 51 anos, o Nequinha,
morador no Morro do Sabão, em Santo Antônio da Platina, está vivendo seu pior
momento, com dois netos dentro de casa para alimentar e educar. Já não tem gás
para cozinhar o pouco alimento que consegue. Para contornar o problema, sua
esposa improvisou um fogão a lenha. As contas de água e luz estão sem pagar e
ele aguarda apenas o corte dos serviços para qualquer momento.
Para piorar, na sexta-feira passada, ele e mais cinco
companheiros, também pais de família, que pegavam material reciclável no Aterro
Sanitário para vender nos ferros-velhos da cidade, foram proibidos pela
fiscalização da prefeitura de voltarem ao local. “Ainda disseram que se
voltarmos seremos presos. Fui à prefeitura e pedi que me arrumassem um serviço.
Qualquer um, nem que fosse para limpar meio-fio, carpir terrenos, qualquer
trabalho que me rendesse um pouco de dinheiro. Ficaram de ver, mas já faz uma
semana. Esse tempo pode parecer curto, mas é uma eternidade para quem precisa
colocar comida dentro de casa”, comentou avisando: “Voltarei no aterro de
qualquer jeito. Não consigo nem um “bico” para levantar um pouco dinheiro. Sei
trabalhar como pedreiro e pintor, mas nessa época não tem aparecido serviço.
Também trabalho na colheita de café, mas ela só começa daqui um mês e meio. Até
lá não sei o que acontecerá com minha família”, disse.
Um dos netos de Valter tem problemas mentais. “O médico receitou
medicamentos que não encontro na farmácia da prefeitura e custam cerca de R$
800. Não posso pagar. A volta as aulas também me deixam depressivo. O material
escolar dos meus netos são os mais precários que existem. Alguns itens, já
peguei no lixão”, contou. “Quero que eles tenham mais dignidade, que não sejam
discriminados pela pobreza em que estão vivendo. Quero que eles usem roupas
melhores, que frequentem a escola com materiais de qualidade. Quero que se
orgulhem de mim”, disse emocionado.
COOPERATIVA
DE RECICLÁVEIS
Já que a prefeitura não permite mais a presença de catadores de
recicláveis no Aterro Sanitário por problemas de salubridade, e nem consegue
oferecer uma alternativa de serviço para eles, Valter e seu amigo Carlos
Roberto Ferreira sugerem que seja criada uma Cooperativa de Recicláveis.
“Sabemos que a Promoção Humana faz esse serviço, mas a verdade é que ela não
recebe nem um terço do que as pessoas jogam fora. Não existe uma política de
conscientização nem um trabalho constante de coleta desses materiais. Sugerimos
que seja formada uma cooperativa. Essa atividade já existe em diversas cidades
vizinhas, até mesmo menores que Santo Antônio. A prefeitura só precisaria
ajudar com equipamentos como prensa e esteira. No Aterro existe um barracão sem
utilidade. Poderia ser aproveitado pela cooperativa”, explicaram.
Segundo os dois catadores, no aterro é possível encontrar uma
diversidade enorme de produtos aproveitáveis, como garrafas pet, plásticos,
fios de cobre, ferro, enfim, tudo o que os moradores põem no lixo por não
saberem para onde encaminhar. “É impressionante o que achamos lá. Poderíamos
ganhar dinheiro com a cooperativa. Muitas famílias deixariam de passar
necessidades e não precisariam da assistência da prefeitura,” avaliou.
Valter disse que nunca procurou a Assistência Social do
município para pedir ajuda. “Nunca fiz isso. Sempre me virei. Mas gostaria que
um dos assistentes sociais fosse na minha casa para ver a situação que estou
vivendo. Queria que abrisse o armário para ver se encontra comida lá dentro”,
concluiu.
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